segunda-feira, março 31, 2008

Deixa eu pintar o meu nariz...

Estava eu no fim da tarde de ontem assistindo pela televisão a mais uma vitória do São Paulo (parece que agora vai) quando, por volta das 17h30, toca meu celular. Olho no visor e está escrito: Elaine. Pensei: “que surpresa, o que ela quer?” Atendo e ela começa: “Meu, vai ter um espetáculo de circo de rua lá em Pinheiros as sete, vamos?” Um parêntese: não sei como me surpreendo, ela sempre me liga convidando pra coisas malucas (mas fantásticas) e em cima da hora. Eu, já com algumas cervejas na cabeça, meio assustado com o convite e preocupado com o jogo, pensei por um instante e disse, “sim, vamos”. “Por que não?” Pensei na seqüência. Dava tempo de ver o jogo, tomar um banho, me arrumar e tomar o ônibus. Como disse pra ela quando a encontrei: “Se tu fizesse esse convite com eu ainda morando na Cohab, ia te xingar!”. Afinal, não daria tempo.

Mas agora minha realidade é outra e pouco depois do horário previsto, já de noite, eu estava descendo no ponto de ônibus da rua Cardeal Arcoverde com rua Fradique Coutinho, zona oeste paulistana. Voltei uma quadra e entrei na rua Belmiro Braga, local que abrigou, em seu final, a quarta edição do Circo no Beco, apresentação de arte circense de rua, patrocinada apenas pelo chapéu, como eles comentavam a cada vez que pediam ajuda financeira à platéia. Entrada grátis, sim. Em tempos de vacas magras, isso é importantíssimo. Ainda não fazia muito frio, então deu pra curtir tranqüilo boa parte do evento.

Os amigos da Elaine foram chegando, o que aumentou o grupo, deixando um clima mais divertido até. Não que não estivesse só com minha amiga, que é super engraçada e sempre damos boas risadas juntos. Umas pessoas já conhecia, a maioria não, mas estávamos todos prontos para ver bons espetáculos. E vimos: palhaços equilibristas, um casal fabuloso de trapezistas, que também depois fez malabares bem legais, uma palhaça portenha cantando uma música triste enquanto que uma trapezista dançava com uma corda, com a colaboração de uma mangueira que jorrava água, simbolizando as lágrimas de tristeza por um coração partido.

Palhaço mímico, malabares diversos, diabolô, ou o pai do iô-iô (o cara fez coisas incríveis), além da banda Em Construção, com bateria eletrônica no corpo do músico e chapéus de obra, muito interessante. Um palhaço de uns três anos chamado Bistequinha pra ajudar a angariar fundos pra patrocinar o festival circense que foi de sexta a hoje, com um a festa de encerramento na próxima quinta (esta é 10 reais a entrada).

Levando-se em conta que eu nunca fui num circo, pelo menos que eu me lembre, posso considerar esta minha primeira vez. Tem todo aquele clima infantil, de inocência. Além da maioria jovem, haviam algumas crianças que interagiam de forma ingênua com os palhaços, trazendo uma suavidade que remetia à nossa infância. Voluntários fazendo papel de móveis, multidão aglomerada no chão pra ver os números, boxeadores lutando em câmera lenta, momentos divertidos pra quem achou que o domingo acabaria com nada demais para fazer.

Saímos de lá mais de 23 horas, já com frio, mas com as mentes mais leves. O mais engraçado é que quase ninguém ouve falar dessas coisas, tão interessantes e gratuitas. Se vivêssemos tais ilusões de quando em vez, provável que mais alegres seríamos, ao menos. Espero que ano que vem eu possa estar lá mais uma vez e viver um tempo que nunca tive oportunidade de saborear. Uma infância tão simples e feliz, tão distante do meu nariz.

domingo, março 30, 2008

Foguete

Hoje é um dia frio
Perco-me em pensamentos depressivos
Uma música traz certa melancolia
Mas também muita paz.

Intensamente percorro o ponteiro do relógio
Olho para trás sem raiva
Com uma ponta de decepção, é verdade
Mas penso na surpresa que o futuro me guarda
E sinto um calafrio, pois não sei se será bom ou ruim.

Sol, céu azul, sorrisos, abraços
Cerveja com amigos, conversa, alegria
Tudo é possível naquele que vive
Tudo é realizável quando você olha para o outro lado.

Outro dia eu caminhada por ruas escuras
Era noite e tudo se assemelhava um tanto obscuro
Ninguém parecia prestar atenção
Olhos pra frente, mente fechada em si mesmo.

Tudo me deixou um tanto resoluto
À espera de um milagre, no aguardo de algo
Que a gente nunca tem a certeza do quê
E mesmo assim sofre solidão e insônia.

Mas quando eu estava triste você sorriu
E a noite virou dia
E toda angústia e dor se foram
Com a velocidade de um foguete que parte para o céu.

E a partir dali eu comecei a perceber
Que há milhões de coisas para agradecer
Que existem pequenos atos que me transformam num ser melhor
Que eu vivo cada dia do jeito que me é possível
Mas mesmo assim de forma intensa e cheia de vitalidade.

O dia que eu puder compartilhar isso
Serei a pessoa mais feliz de todo o mundo
E quando a estrela cadente aparecer
Eu vou precisar pedir só mais uma coisa.

30 de março de 2008.

quarta-feira, março 19, 2008

Manda Una Señal

Gostaria de colocar hoje uma letra de uma música que eu gosto muito, porque é dos melhores pop-rock feitos nos últimos tempos. Sim, a letra é melosa, o clima é romântico, mas a guitarreira é pesada e a bateria é forte. A banda? Maná. Pode? Pode, claro. Esses mexicanos são bons pra caramba e o último disco deles "Amar es Combatir", de 2006, é bom demais, a maioria das músicas com som bem atual, rock moderno, por vezes alternativo, bem interessante.

O ruim é que 90% das músicas são sobre amor. Gosto desse tipo de música, mas ouvir um disco inteiro num dá pra ser a todo o momento e direto. Outros discos deles têm crítica social, etc., mas esse fala quase só de amor. Bom que menos meloso do que os outros discos, sem choramingar muito, trata de outros temas interessantes, o lado carnal do amor, o instrumental ajuda a não deixar depressivo, etc. Eles têm uma forma própria e interessante de abordar o tema amor e nesse disco, na minha opinião, eles acertaram a mão.

A letra que coloco abaixo é da música que mais gosto, porque a batida lembra "Supersonic" do Oasis e as guitarras são quase futuristas, bem pesadas, com teclados legais, e a letra é bem bacana. E também me ajuda a "entrenar el español". Em breve colocarei outras letras deles. Gostaria de por o mp3.

Aí está:

Manda Una Señal

Te quiero, sí te quiero
Voy andando como fiera tras tus pies, amor
Te veo y te deseo pero tú tienes tu dueño y no te puedes zafar

Los días se pasan sin ti
Las noches se alargan sin ti, sin tu amor, sin tus besos

Ay, si tuvieras libertad, a tu lado yo estaría, amor
Hey, dame, dame una señal, cuando seas libre mi amor
Ay, no lo puedo soportar
No me quiero derrumbar
Mándame un mensaje, una señal
Manda una señal de amor
Manda una señal, amor

Te veo acorralada de unos brazos que no te dejan mover
Te deseo y me deseas pero estás muy aprisionada, corazón
Y no viviré sin tu amor
Y no pararé hasta tener tu amor y tus besos

Hey, estoy viviendo sin vivir
Estoy muriendo sin poder morir
Hey, dime, dime, tell me too, cuando seas libre mi amor
Ay, no lo puedo soportar
No me quiero derrumbar
Mándame un mensaje, una señal
Mándame tu luz, amor
Manda una señal, amor

Vivir, sin ti vivir, estarse muriendo sin morir
Estar, sin ti estar, estarse muriendo sin morir
Amor, dónde estarás, manda un mensaje, una señal
Y no, no pararé, no viviré sin ti, amor... ¡NO!

terça-feira, março 18, 2008

Part of the Queue

Acho que eu ainda não consegui encontrar minha alma nessa cidade...

Part of the Queue*

De repente eu percebi que perdi meu rumo nessa cidade
As ruas e as milhares de cores se mancharam em uma só
Eu caí, o céu não irá me ajudar,
Eu chamei e ninguém pode me ouvir.

Fique alto, fique orgulhoso
Todo começo quebra uma promessa
Estou tendo problemas em achar minha alma nessa cidade.

Os nomes nos rostos nos lugares não significam nada pra mim
É que tudo que eles conseguem fazer pra ser parte da fila nessa cidade

Eu caí, o céu não vai me ajudar,
Eu chamei e ninguém pode me ouvir
"Não vai ter amanhã" eles dizem,bem...eu digo " mais do que piedade".

Fique alto, fique orgulhoso
Todo começo quebra uma promessa
Estou tendo problemas em achar minha alma nessa cidade.

Fique alto,f ique orgulhoso
Todo começo quebra uma promessa
Estou tendo problemas em achar minha alma nessa cidade.

Achando minha alma nessa cidade
Continue tentando...

*Música escrita por Noel Gallagher, do Oasis

sexta-feira, março 14, 2008

Uma doença, um sentimento

A tosse o deixava semelhante a um tuberculoso. Um escarro seco, a expulsar coisa alguma, vinha-lhe atormentando a vida há pelo menos três dias, desde uma virada de tempo trouxe garoa à cidade. O céu azul deu lugar a um cinza escuro, carrancudo, sem aparecer um fio de luz ou calor sequer, apenas frio, frio e mais frio. E aquela penumbra típica do inverno a enegrecer cada prédio, calçada, sombreando ainda mais os becos e cantos da grande metrópole.

Para piorar a situação de nosso herói, eis que na última terça-feira, enquanto voltava do cinema, resolveu caminhar pelas ruas sem tirar o guarda-chuva de sua mochila, enquanto aquele chuvisco gelado caia em seu corpo. Preferia ficar molhado a ter que disputar cada centímetro de calçada com outros guarda-chuvas, mais ignorantes que o dele. No entanto, tossia sem parar, com acessos cada vez mais longos. Parecia em alguns momentos Íppolit*, dada a gravidade do problema. Nessas horas devaneava: “que vontade de morrer até me recuperar dessa enfermidade maldita! Parar com tudo, fechar os olhos e assistir a escuridão total, sem existência, até chegar à cura”.

Era o momento mais alto do delírio que a febre poderia causar. Ali se poderia realmente pensar que o pobre coitado daria cabo da própria vida só para evitar aquele sofrimento. “Pra mim é bem melhor me trancafiar em meu quarto e dormir até passar todo e qualquer sinal que ela ainda está dentro e mim”, rangia com os dentes. Um torpor dominava seu corpo, que passara a ficar dolorido, tirando todas as forças para sair de casa, estudar, encontrar os amigos. Regressara a pouco do trabalho, permanecendo deitado por cerca de duas horas.

“Que filme esquisito aquele. À parte a questão do aborto feito de forma clandestina num país comunista. De qualquer forma, gostei do cenário gélido e triste de uma Romênia oprimida por uma ditadura que nada tinha a ver com o proletariado”, recordara a respeito da película “4 meses, 3 semanas e 2 dias”, que vira no dia em que tomou a chuva que piorou seu estado de saúde. “Aquelas nuvens todas, a escuridão da noite, aquela menina andando por toda a cidade à guisa de solucionar o caos que um sexo feito sem cuidado provocou em sua amiga e que poderia muito bem ela ser a próxima. Mas o que realmente me chamou a atenção foi aquele ambiente melancólico de disputas diárias por um cigarro que não fosse comunista, por uma bala industrializada no país inimigo, por um sabonete de marca capitalista, brigas cotidianas por sobrevivência, nada mais.”

Após divagar, entre um cigarro e uma tossida que por vezes, esguichava sangue no lenço, cismara de levantar e ir ao mercado comprar chá para amenizar seu espírito. Decidido, pôs uma roupa qualquer, encapotou-se com um cachecol e sua boina favorita e rumou ao destino. No caminho foi abordado por uma idosa que pedia um trocado para tomar leite. Como sempre, negou, dizendo não ter dinheiro. Mais tarde, na fila do caixa, uma jovem moça negra pediu 0,50 centavos para comprar pão. E ele havia percebido que ela estava com outros jovens para comprar bebida alcoólica para farrear em algum lugar. Mesmo assim, nosso herói oposto cedeu a moeda e pôs-se a sorrir, satisfeito com a boa ação. Depois percebera o ato idiota que tomara, negando a quem precisava, oferecendo, em contrapartida, a quem não tinha porquê. Enrubesceu e franziu o cenho, demonstrando que se envergonhara do que fizera.

No caminho recebeu um telefonema de uma amiga que o chamara para tomar alguma coisa num bar cerca de meia hora de metrô de onde se encontrava. Aceitou o convite sem dizer como estava, apesar de que a tosse durante a conversa evidenciara seu estado. “Você está bem?” Perguntava a interlocutora. “Estou ótimo, só preciso de um chá e em uma hora estarei aí”, respondera nosso cavaleiro hipocondríaco.

Subiu as escadas do edifício cambaleando. Conseguiu, sofregamente, fazer o chá e tomá-lo com um remédio para melhorar um pouco e conseguir sair. Mas não foi possível. Desmaiou no chão da cozinha, acordando somente quatro horas depois, com o barulho distante de uma ambulância, que indicava que a ajuda se aproximava. E era verdade. Dois minutos depois a porta era arrombada com auxílio da equipe de resgate, erguendo o corpo que jazia no piso congelante para uma maca, iniciando o diagnóstico e tratamento. Graças a sua amiga que estranhou a voz ao telefone e, ainda mais, a demorar em mais de duas horas para aparecer ou dar qualquer retorno, sem sequer atender o celular.

Com o rosto lívido, acordara do desmaio, mas seus olhos arregalados e inertes demonstravam que ainda estava com a consciência distante. E realmente assim se sucedia. Sua mente estava em uma garota que vira no cinema na última terça-feira. Garota essa com quem trocara algumas palavras a respeito do filme, num banco verde que se encontrara numa espécie de sala de espera, ou ante-sala, onde se aguarda para a próxima sessão ou se conversa a respeito do filme visto, a base de café, salgados e tudo que seu dinheiro possa pagar. Mas ele tomara apenas um capuccino, já que a grana estava curta. Ela comera um pão de queijo e tomara um achocolatado bem quente para combater o frio que se apoderara daquele fim de tarde.

Bateram papo por cerca de uma hora, até ela pular da cadeira como quem recorda de algo e partir, num sobressalto, pela rua, sem se despedir do novo amigo. O rapaz, por sua vez, nem tivera tempo de objetar coisa alguma, ficando boquiaberto com a beleza da garota e surpreendido aquela atitude. Só percebeu que não possuía nenhum contato dela, muito menos sabia seu sobrenome somente cinco minutos depois, quando se refez da cena. Saiu atordoado, derrubando xícaras, cadeiras, sobre as pessoas. Correu feito um maluco, em vão. Ela já tinha partido. Ele, então, passara a acreditar nos dias subseqüentes que esse curioso evento contribuíra para a piora de sua situação, mas segredara em seu coração esse pensamento. Até aquele momento.

“Acorda homem!”, exclamava sua amiga, tirando-o das recordações recentes. “Você está sendo levado para um hospital. Você desmaiou, bateu a cabeça e quase teve traumatismo craniano com a queda. O que tens? Por que não me avisou que estava doente?”, reclamava, insistentemente. Ele, ao contrário, quase não conseguia pronunciar coisa alguma, balbuciando apenas o nome daquela que encontrara três dias antes no cinema: “Helena! Helena!”.

* Íppolit, personagem da obra “O Idiota”, de Dostoievski. Um jovem tuberculoso à beira da morte, que aproveitava sua condição de quase-moribundo para se fazer de coitado e, ao mesmo tempo, acertar as contas com seus adversários e azucrinar quem quer que fosse. As descrições do autor sobre como eram os acessos de tosse do personagem são muito reais.