domingo, outubro 28, 2007

Um texto que não foi pro Rabisco...

O Rabisco deu uma sumida do cenário devido a problemas financeiros e de má vontade de seres humanos. Este foi o último texto que escrevi pra lá, mas que não foi ao ar. É sobre o novo disco e a volta dos The Smashing Pumpkins, depois de sete anos.

O melhor possível

The Smashing Pumpkins voltam com Zeitgeist, um disco com bons momentos e esforçado, nada mais que isso; porém, fica a pergunta: precisa de mais no cenário atual?


Rodrigo Herrero (rodrigo@rabisco.com.br)

Billy Corgan adora fazer relações entre datas. The Smashing Pumpkins teve seu primeiro canto do cisne no dia dois de dezembro de 2000, no Cabaret Metro, de Chicago, mesmo local em que, 12 anos antes, havia ocorrido o primeiro concerto. Quando a banda acabou, sobrou para os fãs a brincadeira, com gosto amargo de esperança, com o encarte do álbum de lados-b Pisces Iscariot (1994), em que aparece o número 2007 encerrando um texto.

Seria um sinal de uma possível volta? É, parece obra do careca que chegou à casa dos 40, mas não deixou seu lado criança e megalomaníaco de lado. Pois não é que a banda voltou em 2007? Tá, o lançamento de Zeitgeist era pra ser no dia 7 de julho, mas como a data caia num sábado, a indústria fonográfica convencera o rapaz a lançar no dia 10 mesmo, uma terça-feira. Mas a simbologia persiste. Como que num chiste, numa piada: “We are The Smashing Pumpkins 2007”, anuncia o vocalista, num show na Inglaterra. Está correto. Afinal de contas, nessa volta, só ele e seu fiel parceiro Jimmy Chamberlin fazem parte.

A baixista Darcy Wretzky, que saiu em 1999, no fim das gravações de Machina: The Machines of God (2000), e o guitarrista James Iha, que tocou até o último show no Cabaret Metro, não fazem parte deste retorno. Em seus lugares estão Ginger Reyes e Jeff Schroeder, dois pinos, ou, como um amigo-fã comentou: “dois estagiários de palco”. Isso porque, o álbum conta apenas com Chamberlin na bateria e Corgan cuidando de todo o resto. Na produção, Roy Thomas Baker (homem responsável pela gravação do clássico do Queen “Bohemian Rhapsody”) e Terry Date tentam dar uma cara “crua” ao trabalho.

Duo e nada mais
A questão é a seguinte: qualquer fã mais maluco que adore ouvir versões pré-disco e sabe que os Pumpkins liberaram praticamente todas as já gravadas na carreira, deve ter ouvido as demos do Mellon Collie and the Infinite Sadness (1995), o grande sucesso da banda, álbum duplo mais vendido da história com 18 milhões de cópias, e percebido que o que aparece é apenas uma guitarra e uma bateria acompanhando.

Ou seja, Billy Corgan nunca precisou nada além de seu parceiro musical para tocar os Pumpkins. Tanto que, quando o demitiu, em 1996, após envolvimento de Chamberlin com drogas, incidente que provocou a morte do tecladista que acompanhava a banda na turnê, Jonathan Melvoin, os Pumpkins passaram quase três anos sem rumo, trocando de baterista como quem troca de blusa numa loja de roupas. Não é a toa que Adore (1998) foi um CD eletrônico em boa parte, acústico em outra, com pouco atrativo à grande massa, que esperava um Mellon Collie parte two. Sem baterista, Corgan ousou e pagou o preço. Talvez até por isso, resolveu recrutar o amigo de volta para o disco-despedida de 2000.

Uma volta sem retorno às origens
Voltando a 2007, claro que os barulhinhos de James Iha fazem falta, muito mais do que a rabugice e a incompetência técnica de Darcy Wretzky. Mas é necessário levar em conta que os tempos são outros. Sete anos não é a mesma coisa que dois, tempo em média nos dias de hoje que uma banda leva para gravar um novo trabalho. É preciso absorver Zeitgeist do jeito que ele pôde ser construído, da forma que ele conseguiu ser.

A crítica, em geral, e principalmente a brasileira, em particular, resolveu meter o pau no disco, dizendo que é fraco, rock burro, chato, sem o mesmo atrativo, etc. O que, em verdade, não deixa de ter um milésimo de fundamento, se refletir no álbum em cima do que ele não pode ser, isto é, uma volta às origens. Billy Corgan, em suas entrevistas, não disse, em nenhum momento, que voltaria com o que um dia o conjunto foi. Musicalmente falando.

Apesar de nos shows (sempre lotados e bem comentados pelo público) ele tocar os grandes clássicos – e era isso que ele queria quando lançou seu trabalho solo, em 2005, publicando num jornal de Chicago que queria os Pumpkins de volta por causa das músicas –, a sua maior preocupação é em fazer coisas novas, diferentes, que ele goste e que o público atual aproveite. Uma corrente de pensamento levanta a hipótese de que o disco foi feito pra garotada atual, que ouve porradaria sem preocupação e que o público antigo não foi contemplado. Pode até ser. Mas é para se pensar quem é esse público atual, antigo, etc.

A estética do álbum, de algumas letras, até são semelhantes ao American Idiot (2004) do Green Day, mas a concepção do som não. Não precisa. A idéia dessa volta era atingir ao maior número de pessoas, com um som pesado (mas, ao contrário de Billy Joe e companhia, na praia do heavy metal, até pela influência ao longo da carreira), que chamasse a atenção para erguer o careca a condição de famoso novamente. Se conseguiram ou não atingir a um patamar satisfatório, vai de cada um ouvir o álbum e tirar as próprias impressões.

À parte a palhaçada de lançar cinco capas de cores diferentes e versão de CD com bônus em megastores, o que dá pra dizer é que Zeitgeist procura ser pesado, só que sem soar falso, a não ser em alguns momentos. Trata-se de uma síntese da década atual, aquele peso gratuito das guitarras, sem uma grande harmonia e preocupação com o que está sendo executado. Vocais e efeitos nas vozes exagerados ao extremo também atrapalham um pouco o andamento.

O álbum
“Doomsday Clock” (tema do filme Transformers) começa bem, com uma batida forte de bateria e uma guitarra berrando para todos os lados. “7 Shades of Black” mantém o clima heavy metal do disco, com suas guitarras e seu ambiente semelhante ao tema “The End is The Beginning is the End”, de 1997, feito pela banda para o filme Batman and Robin. “Bleeding the Orchid” tem uma levada interessante e lembra os bons momentos do conjunto no passado, assim como “That’s the Way (My Love Is)”, uma balada com guitarras pesadas, de letra emocionante e ritmo comovente.

Aí vem o primeiro single. “Tarantula” é a música de apresentação mesmo, guitarras em harmonia com a bateria, vocal afinado com a proposta da canção, das melhores músicas do CD. “Starz” é fraquinha no geral, mas tem passagens roqueiras. “United States” berra “revolução”, mas dá preguiça de ouvir seus quase dez minutos. Porém, a parte instrumental da segunda metade da canção vale a pena. “Neverlost” abre o antigo lado-b do vinil, a segunda etapa, de forma harmoniosa e triste, uma verdadeira quebra da agitação das faixas anteriores. É bonita, fala da (falta de) preocupação com fim do mundo, temas tristes, baladaça.

“Bring the Light” e “(Come On) Let’s Go!” (que até é legalzinha) são quase heavy metal, trazendo consigo, por isso, aquele ranço do (glam) rock desgastado do fim da década de 80. Dispensáveis. Já “For God and Country” tem uma batida marcada, vocais esquisitos, mas uma guitarra e um teclado bem interessantes, que dialogam com as “múltiplas” vozes de Corgan. “Pomp and Circunstances” encerra o disco de forma estranha. É difícil dizer o que essa música é: sem ritmo, sem guitarra base, sem baixo, sem bateria, com efeitos diversos, gongo, foge totalmente do que é o álbum.

No final das contas, Zeitgeist é bacaninha. Seria melhor se “Stellar”, que foi incluída numa versão do I-Tunes (como são bobos, é mais fácil achar essa mp3 na Internet do que comprar por lá), estivesse no álbum, pois bate tudo que está no disco, ao menos na opinião deste pobre escriba e fã da banda há 12 anos. Zeitgeist, para mim, deve ser analisado tendo como referência quem são os integrantes responsáveis pela banda hoje, com mais idade, longe do alto da capacidade que um dia possuíram.

Dentro do que foi possível e levando em conta a mesmice esdrúxula que anda o rock hoje, Corgan e Chamberlin não fizeram feio, mas, sim, produziram o melhor que poderiam, dadas todas as circunstâncias. Contudo, vale salientar, se olhar para o passado e for compará-lo com os discos antigos, Zeitgeist será criticado, condenado e deixado na masmorra dos fracassos. Com aquela frase: “Pra que foram voltar?”. No fim das contas, tudo pode ser visto como desculpa para não detonar um álbum apenas razoável. É importante também fazer o contraponto: dadas tantas voltas, tantas porcarias indo e vindo, se recriando, nascendo, por que uma das melhores bandas da década de 90 não poderia tentar um recomeço? Acredito que, dentro desse tipo de reflexão, eles cumpriram bem o papel. Fica agora uma última e, penso, a mais importante indagação: isso vai durar até quando?