quarta-feira, julho 07, 2004

Campinas, uma cidade legal*

Acho que estou pegando o costume em escrever no metrô. Me colocar à frente do computador para escrever essas crônicas obrigado não tem funcionado. Acho que o metrô me traz mais liberdade, não tem prazo, além de possuir algumas vezes detalhes enriquecedores. Mas não sei, preciso parar de me obrigar a fazer coisas não decisivas e dar mais atenção ao meu trabalho, ao meu livro, a agência, coisas que eu fujo às vezes por insegurança. Oras, todo mundo tem isso, um mais, outros menos.

Dessa vez vou ouvindo música, um componente vital para mim. No cd player todo estropiado do meu amigo Fernando toca Pisces Iscariot, dos Smashing Pumpkins. Tem coisas calmas e pesadas, baladas de violão e percussão, barulheiras infernais e solos longos, sendo, portanto, uma boa variação para às 6 da manhã. Agora estou no metrô Patriarca.

Engraçado, vi uma mulher andando na plataforma do metrô Artur Alvim que me lembrou uma grande amiga a quem estimo muito, mas que, por situações que a vida nos prega, se afastou um tanto de mim, o que é até compreensível. Mais engraçado é que na Secretaria do Trabalho, sexta-feira passada, durante a apresentação que fizemos do projeto da agência de notícias para um evento do Programa Bolsa Empreendedor, vi uma garota que parecia por demais esta amiga. Estava sentada ao lado de sua colega, muito próximas a mim e de Daniel, e soltava uns olhares em nossa direção. Mas era quase que idêntica, eu cheguei a acreditar que... o nariz fino, o rosto bochechudo, a testa um tanto quanto alta, os longos e enrolados cabelos castanhos (o detalhe da cor não diz muito afinal, minha amiga cada dia está com uma bela cor diferente para suas madeixas) e uma altivez que me fez olhar umas três vezes para ter a certeza de que não era ela mesmo. Mas a menina era mais espigada, e ficou rindo durante minha apresentação. E assim, perdeu-se o encanto.

Acho maluco isso de lembrar de outra pessoa ao ver algum desconhecido na rua. Isso me aconteceu semana passada com outra amiga, que mora perto de casa e, depois que a vi, qualquer menina me lembrava ela. É bem provável que seja pelo fato de que há quase um ano não nos encontrávamos, além do que ela é bastante agradável, estimo a presença de tal criatura.

Estou no metrô quando o dia ainda não surgiu. Interessante poder acordar mais cedo e observar esse tipo de coisa. O céu ainda estonteantemente escuro, os trilhos quase invisíveis, as luzes dos prédios e dos postes a clarear o negro fim de madrugada. O metrô vazio da loucura das 7 horas, e uma tranqüilidade sem tamanho de uma cidade que ainda desperta.

Tem um garota loira aqui próximo, de cara com o banco. Eu notei que havia alguém e fitei-a discretamente. Bela garota de cabelos amarelos, de rosto bonito e cansado, nariz de batatinha (não chega a ser de batata, mesmo), com um ar enfadado – agora ela pôs-se a dormir de pé, com as mãos segurando-a na barra. Ela passou a observar meus escritos e depois me notou, deve me achar um lunático e ainda um imbecil, por escrever em garranchos tão horrorosos. Estamos no metrô Bresser.

Queria falar sobre a viagem à Campinas, na quinta-feira passada, mas eu não lembro de muitos detalhes. Só sei que conheci a Unicamp, meio sem querer, pois for por causa de uma lotação errada que tomei na Rodoviária, me levando a outro destino. Cheguei bem tarde à casa da professora Tatiana, motivo de minha viagem, mas nada que comprometesse, pois o dia foi pouco produtivo (tocou o celular de uma mulher sentada à minha frente, fez um leve barulho e acendeu uma luz verde no visor, mas a mulher, dona do celular, prosseguiu de braços cruzados, dormindo).

Mas a casa da Tatiana é um barato. A tia dela é argentina e está no Brasil para cuidar de sua irmã (mãe da professora) que quebrou o fêmur mês passado. Argentino é um povo legal, essa rixa com o brasileiro é invenção nossa e coisa de nacionalismo (tanto de lá como de cá) bobo. Argentino babaca há como também há brasileiro imbecil, isso independe de qualquer coisa. Já a mãe da Tatiana, por causa do infortúnio, reclama de tudo, briga com todos, mas me foi muito cortês e simpática. Ela e o marido moravam em Portugal, mas resolveram ficar de vez no Brasil.

A irmã da Tati (eu, Daniel e Renato ficamos quase íntimos já da professora, de tantos trabalhos que realizamos juntos desde o ano passado, por isso a licença de cerimoniais) está no Brasil também, linda, já foi modelo, está com o marido português e seus três filhos, que são uma graça, principalmente a “Mini”, de 4 anos (num lembro do nome dela) e o Rafael de 7 meses (resolvi transcender o papo do metrô, pois há ainda muito o que escrever, estou dentro de um ônibus no Terminal Bandeira, no centro, para ir trabalhar[1]). Tem também o Gabriel, de 7 anos, ele é caladão e tímido, nem quis conversa com a tia, enquanto eu estava por lá. Já o Rafinha é uma alegria sem tamanho, sorria para mim a todo o momento e eu brinquei muito com ele, apesar da minha falta de jeito em pegá-lo, enquanto tentávamos fazer trabalho, já que Tati tinha que cuidar da criança, pois os pais haviam saído com as outras crianças.

Campinas é uma cidade legal, sem muitos prédios, com muitas casas e verde, muito verde. Isso que me chamou a atenção, já que em São Paulo só se vê o cinza dos prédios espetando o céu azul-cinza-poluição. Campinas pareceu-me bastante plana – o que caiu por terra num segundo passeio de carro pela cidade, repleta de subidas e descidas em alguns pontos –, com seu matagal de beira de estrada. E eu sou louco para conhecer o Parque Taquaral, que passei em frente duas vezes que naquela cidade fui, mas nunca tive a chance de adentrar lá (clima bem interiorano, quente, com as plantações de milho do lado da estrada, onde desço para a casa da Tati; clima ótimo, adoro viajar e sentir o chão, o vento, a vida do interior e apreender um pouco disso). Parece muito bonito o parque, com um lago enorme, repleto de árvores e, também, dá para correr em volta dele, que possui uma pista cimentada em todo o seu entorno (tá foda escrever com o ônibus em movimento).

O Centro de lá é movimentado, mas muito tranqüilo quando se pensa no centro da capital paulista; e olha que dessa vez eu fui numa quinta-feira. A Rodoviária é simples, com o andar inferior das plataformas dos ônibus, com banca de jornal e banheiro, e, em cima, as cabines (sei lá o nome disso) que vendem bilhetes, uma pequena livraria e várias lojas para comer, incrível. Esse andar superior dá saída para uma rua apertada, que fica parada à noite de tanta gente que lá passa para deixar/pegar alguém. Virando ao fim da rua, à esquerda, nota-se uma pracinha insignificante e o andar de baixo dos ônibus, junto à descida do asfalto.

Passei um dia agradável e na volta Tati deu carona até a Rodoviária. Fui presenteado com um final de tarde magnífico. Mesmo escuro já, quando paramos num farol, observei à minha direita, atrás de uma cerca avolumada por árvores, uma parte baixa de Campinas e vi o céu lindo, com diversas cores como azul, rosa, vermelho, amarelo, laranja, se misturando e formando um quadro delicioso na noite campineira. Bom para fechar o dia. Agora eu preciso ir lá um dia à passeio para conhecer a cidade e saborear melhor momentos como esse.

[1] O centro de São Paulo é mui belo, mesmo. Na passagem do metrô Anhangabaú que dá acesso ao Terminal Bandeira dá para ver o início da avenida Nove de Julho e, com isso, o centro iluminado, pois o dia ainda amanhece. O interessante é que as luzes artificiais dos postes e naturais do céu contrastam com os paredões de concreto. Simplesmente fabuloso.

* Texto escrito na segunda-feira pela manhã, à caminho do trabalho.